quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Agrotóxicos no seu estômago

Os porta-vozes da grande propriedade e das empresas transnacionais são muito bem pagos para todos os dias defender, falar e escrever de que no Brasil não há mais problema agrário. Afinal, a grande propriedade está produzindo muito mais e tendo muito lucro. Portanto, o latifúndio não é mais problema para a sociedade brasileira. Será? Nem vou abordar a injustiça social da concentração da propriedade da terra, que faz com que apenas 2%, ou seja, 50 mil fazendeiros, sejam donos de metade de toda nossa natureza, enquanto temos 4 milhões de famílias sem direito a ela.

Vou falar das consequências para você que mora na cidade, da adoção do
modelo agrícola do agronegócio. O agronegócio é a produção de larga escala, em monocultivo, empregando muito agrotóxicos e máquinas. Usam venenos para eliminar as outras plantas e não contratar mão de obra. Com isso, destroem a biodiversidade, alteram o clima e expulsam cada vez mais famílias de trabalhadores do interior.

Na safra passada, as empresas transnacionais, e são poucas (Basf, Bayer,
Monsanto, Du Pont, Sygenta, Bungue, Shell química...), comemoraram que o
Brasil se transformou no maior consumidor mundial de venenos agrícolas.

Foram despejados 713 milhões de toneladas! Média de 3.700 quilos por pessoa. Esses venenos são de origem química e permanecem na natureza. Degradam o solo. Contaminam a água. E, sobretudo, se acumulam nos alimentos.

As lavouras que mais usam venenos são: cana, soja, arroz, milho, fumo,
tomate, batata, uva, moranguinho e hortaliças. Tudo isso deixará resíduos
para seu estômago. E no seu organismo afetam as células e algum dia podem se transformar em câncer.

Perguntem aos cientistas aí do Instituto Nacional do Câncer, referência de
pesquisa nacional, qual é a principal origem do câncer, depois do tabaco? A
Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) denunciou que existem no
mercado mais de vinte produtos agrícolas não recomendáveis para a saúde
humana. Mas ninguém avisa no rótulo, nem retira da prateleira.


Antigamente, era permitido ter na soja e no óleo de soja apenas 0,2 mg/kg de resíduo do veneno glifosato, para não afetar a saúde. De repente, a Anvisa autorizou os produtos derivados de soja terem até 10,0 mg/kg de glifosato, 50 vezes mais. Isso aconteceu certamente por pressão da Monsanto, pois o resíduo de glifosato aumentou com a soja transgênica, de sua propriedade.

Esse mesmo movimento estão fazendo agora com os derivados do milho.

Depois que foi aprovado o milho transgênico, que aumenta o uso de veneno, querem aumentar a possibilidade de resíduos de 0,1 mg/kg permitido para 1,0 mg/kg.

Há muitos outros exemplos de suas consequências. O doutor Vanderley Pignati, pesquisador da UFMT, revelou em suas pesquisas que nos municípios que têm grande produção de soja e uso intensivo de venenos os índices de abortos e má formação de fetos são quatro vezes maiores do que a média do estado.

Nós temos defendido que é preciso valorizar a agricultura familiar,
camponesa, que é a única que pode produzir sem venenos e de maneira
diversificada. O agronegócio, para ter escala e grandes lucros, só consegue
produzir com venenos e expulsando os trabalhadores para a cidade.

E você paga a conta, com o aumento do êxodo rural, das favelas e com o
aumento da incidência de venenos em seu alimento.

Por isso, defender a agricultura familiar e a reforma agrária, que é uma
forma de produzir alimentos sadios, é uma questão nacional, de toda
sociedade.

Não é mais um problema apenas dos sem-terra. E é por isso que cada vez que o MST e a Via Campesina se mobilizam contra o agronegócio, as empresas transnacionais, seus veículos de comunicação e seus parlamentares, nos atacam tanto.

Porque estão em disputa dois modelos de produção. Está em disputa a que
interesses deve atender a produção agrícola: apenas o lucro ou a saúde e o bem-estar da população? Os ricos sabem disso e tratam de consumir apenas produtos orgânicos.

E você precisa se decidir. De que lado você está?

(*) Artigo publicado originalmente no jornal O Globo


João Pedro Stédile é economista e integrante da coordenação nacional do
Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).

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