sexta-feira, 27 de abril de 2012

VQ // nº 39 / Educação

Como melhorar a educação pública?

Nossa omissão prejudica gerações de crianças vítimas da precarização do ensino público

POR Sanger Nogueira

Começo o texto pedindo ao leitor que tente se lembrar de ter ouvido alguma vez as seguintes frases saídas da boca de um político: “Garanto a vocês que faltarão professores se eu for eleito”. Seria ridículo um político declamando: “A verba federal para a merenda escolar não será aplicada integralmente” ou ainda: “Não investirei na infraestrutura das escolas”.

Num rápido exame de consciência percebemos que não temos nenhuma lembrança de algum político que seja contra a educação. Não adianta começarmos nenhum debate sem antes examinar que educação e saúde são unanimidades no Brasil. Não é possível ser eleito defendendo reduções no orçamento ou se posicionando contra a melhoria da educação e saúde (em um país com uma formação histórica diferente, vide os Estados Unidos, não é problema algum um partido se organizar sendo contra o aumento dos gastos na educação e saúde). Caso fôssemos ingênuos, poderíamos imaginar que a nossa classe política introjetou que a educação e a saúde são as bases para a construção de uma vida saudável.

Deixaremos a questão da saúde de lado e vamos diagnosticar a situação da educação. Primeiro no
âmbito nacional: a questão da melhoria da qualidade do ensino está na ordem do dia nas discussões
atuais. Para Mozart Neves, coordenador nacional do programa “Todos pela educação”, se pegarmos
todo o currículo do ensino médio, o aluno que termina o terceiro ano sabe apenas 11% do que deveria
aprender. A universidade, continua Neves, parceira fundamental para o desenvolvimento da qualidade, tirou a questão da educação de sua agenda.

Ela é responsável pela formação do professor sem conhecer a realidade do cotidiano escolar. A situação do Estado do Rio de Janeiro consegue ser pior do que o cenário nacional. O Rio ocupa a penúltima posição no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb), criado pelo governo  federal para medir o avanço da educação básica em todo o Brasil. A nomeação do economista Wilson Risolia para secretário de educação marca bem a posição: os conteúdos pedagógicos perderam o espaço para os conhecimentos técnicos de gestão de empresas. No estado do Rio, a “educação como prática da liberdade” de Paulo Freire perdeu espaço para Frederick Taylor e seus “Princípios da Administração Científica”. O Rio de Janeiro não percebeu, ainda, que uma escola não é uma  empresa.

Não estamos preparados para as consequências desta mudança de perspectiva na educação. Na esfera municipal temos o drama da infraestrutura precária e o excesso de contratos na secretaria municipal de educação. Em Valença, a função do contrato – ser usado em casos de excepcionalidade – foi corrompida pela dinâmica política da cidade. Eles são utilizados para manter a base de sustentação
do poder executivo e a sua relação com o poder legislativo, não respeitando a realização de concursos
públicos, como exige a nossa Constituição. Frente ao cenário de desafios, qual deveria ser a posição
da sociedade em relação à educação?

A resposta que estamos dando, infelizmente, não é nada satisfatória. Estamos nos ausentando do controle social da educação. Incapazes de nos organizarmos para demonstrar a importância da educação, delegamos ao Estado a função de fiscalizar sua própria ação. Não é difícil perceber a  tendência do Estado em mascarar a real situação da educação: ar condicionado alugado, computador sem uso, excesso de contratos, falta de cursos de atualização. A nossa omissão está prejudicando gerações de crianças vítimas da precarização do ensino público. Há responsabilidades para todos: pais de alunos, professores, membros de igrejas, partidos políticos. Poderíamos nos organizar em torno de um eixo básico de reivindicações:

Plano nacional
• O estabelecimento do repasse de 10% do produto interno bruto para a educação.
• O aumento da carga horária escolar.
• A criação do programa de laboratórios (humanidades, ciências exatas e ciências da natureza) nas escolas.
• A implementação do programa de iniciação científica júnior.
• O estabelecimento de um concurso nacional de entrada no magistério.
• Reforma curricular das disciplinas
• O fortalecimento do piso salarial dos professores.
• Portal da transparência com os recursos enviados para os Estados e municípios.

Plano estadual
• Eleição para diretor das escolas.
• O estabelecimento do número máximo de alunos por turma.
• A criação de uma política de reforma das escolas e construção de novas.
• O estabelecimento de funcionários com conhecimentos pedagógicos na administração da Secretaria de Educação.
• Portal da transparência com os recursos enviados para os municípios.

Plano municipal

• O fim da politicagem na secretaria municipal de educação. Diminuição dos cargos de confiança e o aumento dos cargos originados de concurso público.
• O fim da política de contratos e a realização (e convocação) dos concursados.
• O estabelecimento de conselhos reunindo a comunidade escolar.
• Eleição para diretor das escolas.
• O estabelecimento do número máximo de alunos por turma.
• A criação de uma política de reforma das escolas e construção de novas.
• O estabelecimento de funcionários com conhecimentos pedagógicos na administração da secretaria de educação.
• Portal da transparência com os recursos enviados para as escolas.

Sanger é professor de História

   

16 comentários:

Anônimo disse...

Sanger. Entendo que a qualidade da educação também passa pelo crivo daquilo que vem sendo ensinado. Outro di deparei com uma amiga indignada. Na Escola Municipal Aparecida, por conta da comemoraçao do Dia do Índio, uma criança de alfabetização trouxe para casa um texto onde os índios Coroados são apresentados como "ferozes". Sabemos que eles não eram ferozes. Eles ficaram/se tornaram ferozes. Como agir nesse caso? “Coroados” era a designação dada a várias tribos brasileiras e essa estória de dizer que o índio era feroz não passa de uma construção histórica que serviu e ainda serve ao colonizador. O que pode ser feito para solicitar à direção que ajeite isso? A Igreja já espirrou fora do Estado há muito tempo. Não podemos deixar que os cristão-romanos valencianos continuem a pautar a história escamoteando os crimes que cometeram.

Anônimo disse...

Como melhorar de fto se o corpo diretor é apaniguado de PMDB? NO IEDLP aluno joga bombinha dentro de sala de aula e fica por isso memo. Quem toma fumo é o profesor/a.

Sanger/Regnas disse...

Ao primeiro anônimo: sem dúvida. É muito importante que o professor não "estacione" a sua formação. Esta interpretação sobre os "Coroados" faz parte de um contexto de justificativa para o extermínio dos índios.

Para o professor não estacionar é preciso cursos de atualização. Ocorre que, muitos professores,têm uma alta carga horária de trabalho. Isso impede o professor de procurar atualizar seus conteúdos. Discutir currículo é fundamental!

Sanger/Regnas disse...

Os diretores, com exceções, traíram o ideal de uma educação pública de qualidade. As gratificações do cargo fizeram com que eles esquecessem que são professores. O maior medo do diretor hoje é deixar a direção e voltar pra sala de aula.

Anna Luiza Portugal disse...

Pois é, Sanger, propostas políticas a favor da educação se tornou um cliché faz tempo, assim como as reclamações da precarização do ensino público. As reclamações são repetidas a tanto tempo, da mesma forma, que fica cada dia mais fácil ignorá-las.

É claro que mudanças políticas são essenciais para começarmos a "ajeitar a casa". Mas, e digo isso sabendo que estou contrariando vários colegas, creio que o profissional (seja professor ou membro da direção), tenha a obrigação de ser o primeiro a promover as mudanças. Esperar por melhorias vindas "de cima" é uma lástima, a tanto tempo já o fazem e em nada dá! Antes de apontar a culpa dos outros, exerçamos nosso papel de profissional, aquele para o qual estudamos, nos formamos, prestamos o tal concurso e passamos - sabendo dos desafios que encontraríamos, já que não é novidade, os problemas educacionais no Brasil.

Protestaremos, reivindicaremos, sem esquecer da nossa responsabilidade enquanto profissional educador.

Anônimo disse...

Colocações maduras. Ponderações cabiveis. O educador tem de verde uma enorme responsabilidde. Não d´pra ele continuar a ser agente legitimador do discurno governamental, do civilizador, do homem branco europeu.

Sanger/Regnas disse...

Então Anna Luiza, penso que o professor tem que tomar para si a tarefa de pensar as mudanças necessárias para a educação. As mudanças que devemos propor são, justamente, aquelas que nos impedem de fazer aquilo que aprendemos em nossas faculdades. No entanto, quando tentamos aplicar o que aprendemos dentro de uma sala de aula, nos deparamos com uma série de problemas que estão além de nossas capacidades individuais de superação. Para sair do plano das idéias podemos exemplificar: salas superlotadas, pouca carga horária das disciplinas, drogas/violência/prostituição, falta de material (livros, internet). Por mais disposto que o profissional esteja, ao longo do tempo, a disposição do profissional diminui. Não podemos contar apenas com a disposição dos professores, temos que defender o estabelecimento de um conjunto de situações que permitam que a disposição dos professores não se perca.

Abraços

Anônimo disse...

Você não pode dormir sem saber!
Qual a educação que temos?
Qual a educação que queremos?

Ficou acertado que no dia 8\5 (terça - feira) às 19h , será oficializado o FÓRUM EM DEFESA DA EDUCAÇÃO PÚBLICA - PARTICIPE!

Anônimo disse...

Ei Sanger. Não dá para ser corporativista. 500 anos depois uma profesora ensinar que índios coroados (etnias puris, guaranis, araris etc.) eram ferozes.... é brabo meu irmão!!!É igual André Corrêa defendendo o Cabral na ALERJ.

Sanger/Regnas disse...

Eu só acho que para acabar com esta visão preconceituosa sobre os índios é preciso investir mais nos cursos para professores. Principalmente para aqueles que não tem oportunidade para fazer cursos de atualização.

Anônimo disse...

Ok. Vamos entao dar cursos de atualização para professores. Cursos que ensinem que índios não são ferozes. Pena que para fazer essa leitura seja necessário um curso. Ver televisão não basta. Ler revitas, também não. Pegar livros em biblioteca, conversar com educadores da área, discutir com os colegas da direção, menos ainda. Tem que ser um curso e ponto final. Tá bom. Estamos conversados, então. Ah, um detalhe importante - o curso tem que ser de graça. Professor não ganha nem para comprar pão. E em Valença, de preferência. No centro, sem precisar pegar ônibus; mas, onde mesmo foi que essa professor pegou essa informação? Com o Bispo? Ah, faz sentido.

Anônimo disse...

É isso. No papel tudo é bonito. Fora dele, só no grito.

Sanger/Regnas disse...

No papel é bonito. Na vida real é um desafio.

Raquel Psicóloga disse...

Parabéns pelo texto Sanger! Já havia lido, mas sem oportunidades de publicar que gostei. Parabéns!

Anônimo disse...

Eh caríssimo Sanger,o governo cria vários planos(bolsas)de remuneração ao discente só por estar na sala de aula,propõe mudanças nos dias letivos...e isso de nada resolve o problema de aprendizado,e desempenho do aluno.Só se empurra o conteúdo,e pronto.Se faz provinhas(Olímpiadas de tal),que quando lecionava, alunos com dificuldades nas determinadas disciplinas "passavam"como eles mesmos diziam: "Chutando",e VIVA a educação avançou.
Os tempos mudaram muito rápido e a educação(seu modelo)não condiz com está nova realidade.Nos 11 anos queLecionei(interior-nordeste-bahia),tive coordenadores quais muitos estavam afastados à anos da sala de aula(pavorosos),e estes,mesmo que o professor compartilhasse de informações sobre a realidade de seus alunos,ou reclamassem sobre o livro didático(escolhido pelos sulistas),empurravam um bolo solado.
O que ao meu ver falta ocorrer são reivindicações da classe trabalhadora "Professores".MAS MOVIMENTOS MESMO(não digo sobre piso salarial),unidos a sindicatos,comunidades,alunos,pais...na "briga"por uma reforma,um repensar sobre a educação,sobre a forma de transmitir os conteúdos,maior verba para a estrutura das escolas(incluíndo mais cultura,mas espaço...),mais escolas(evitando salas super-lotadas),maior incentivo a formação do educador.TODOS deveriam AGARRAR está causa.Enquanto isso não ocorrer,e for apenas promessa de campanha,e teoria bonitinha de longa distância.Me parecerá que a Educação não é vista com prioridade de verdade neste país.(Tatiana)

Anônimo disse...

A escola que o Professor Darcy Ribeiro quis implantar no Estado do Rio (mas que Moreira Franco tratou de avacalhar),seria a célula mater de uma escola sonhada hj pelos alunos e professores.
Pena.
Tivemos a chance de mudar e não deu em nada.

No Brasil a capacidade vai de encontro à politicagem e ficamos patinando no mesmo lugar.

Tá muito ruim.
(tb tem que tá,Picciani mandando e desmandando na educação do RJ nos últimos 15 anos só podia estar assim mesmo.)