domingo, 16 de maio de 2010

Entrevista com Libório Costa (pós Secretaria de Cultura)

Entrevista publicado na edição número 29 do VQ impresso.

É a segunda entrevista de Libório Costa ao Valença em Questão. Mas ela se faz necessária. Nesse meio tempo, entre as duas entrevistas, Libório foi chamado para ser secretário de Cultura e Turismo de Valença (segundo ele por causa da entrevista aqui) e pediu sua exoneração. E isso de outubro a fevereiro, apenas quatro meses. Numa conversa franca, pré jogo em que o Botofago se classificaria para a final da Taça Guanabara vencendo o Fluminense, o botafoguense Libório soltou o verbo e desabafou alguns dos problemas vivenciados durante sua gestão. Uma entrevista que vai dar o que falar, como a primeira.

Entrada na secretaria de Cultura e Turismo
- O grande mérito de eu ter sido convidado, um fator detonador, foi a entrevista que eu concedi a vocês. A partir da entrevista as pessoas conheceram minhas idéias, culminando com o convite do Wilson Fort para entrar no governo Fábio Vieira. Isso é senso comum, o Wilson ficou sabendo e aprendeu a dar atenção e valor ao que eu estava fazendo na cidade por causa da entrevista que eu dei para vocês. Muita gente na cidade ficou tomando conhecimento de quem eu era e do que eu estava fazendo por causa da entrevista de vocês. Até então os setores populares, a Folia de Reis, me conheciam, mas a cidade não sabia. A entrevista foi fundamental para meu nome vir à tona.

E quando o governo sentiu a necessidade de tirar a Daniele por questões políticas, fui procurado pelo Wilson Fort me dizendo que ele tinha carta branca no governo e que era o momento de eu assumir a secretaria. Falei que não ia sair de pedra para virar vidraça sem ter compromisso, sem acreditar nisso. Mas ele me vendeu um monte de situações de autonomia, de condições de trabalho, que me levou a acreditar no desafio, mesmo sabendo que ia ser difícil.

Dificuldades - A dificuldade administrativa eu já sabia que ia passar. Esse foi um desafio que eu assumi, e não foi isso que me fez sair da secretaria. O que me motivou a entregar o cargo na sexta-feira, véspera de carnaval, não foram as questões de verba, condições de trabalho. Isso tudo foi complicado, fatores estressantes (nas três semanas anteriores ao carnaval, o telefone da secretaria não tocava, não falava, o celular cortado, sem Internet. Fazer produção sem meios de comunicação... O meu celular pessoal passou a ser o telefone da secretaria, que cortaram por falta de pagamentos).

Saída - Mas o que me levou a sair foi a falta de responsabilidade do Wilson comigo. Ele me convidou para assumir uma secretaria e garantiu condições de trabalho que ele mesmo não cumpriu. Claro que ele teve os problemas dele. Da mesma forma que ele me enganou, foi enganado por falsas promessas do governo Fábio Vieira.

Nem as questões administrativas, por exemplo, que quando entrei solicitei a ele urgentemente um relatório de todas as despesas que não estavam pagas da gestão anterior, ele não fez até hoje. Ele é uma pessoa inteligente, sagaz, perspicaz, mas virou o homem todo poderoso dentro do governo, é dublê de secretário de administração, é dublê de secretário de governo, era o dublê de secretário de cultura.

Na semana anterior ao carnaval se ausentou um dia para gravar programa do prefeito, no outro dia para fazer a edição do Deus tá vendo, então a secretaria de cultura não era prioridade para ele? Ele me deixou numa sinuca de bico, porque quem estava levando o ônus todo da parada era eu, porque eu que era o secretário. Eu não estou aqui para fazer crítica pessoal, mas acho que houve falta de compromisso e responsabilidade. Essa coisa de querer ser o salvador da pátria do governo Fábio Vieira, querer ser o milagreiro, eu acho até uma atitude louvável, mas isso só não resolve. Tem aquela velha frase do Chico Science: “o orgulho, a arrogância e a glória enchem a imaginação de domínio”, e pior ainda são as falsas glórias e os falsos poderes, porque se a glória e o poder legítimos já enchem a imaginação de domínio, pior quando são as falsas glórias e os falsos poderes.

Deus tá vendo - E aí entra uma outra crítica que eu queria fazer que é a questão do jornal “Deus tá vendo”. Nesta edição que o Wilson Fort ficou preparando na semana do carnaval, tem na pagina 02, “Governo Fábio Vieira para o Deus tá vendo”, onde ele coloca: “Preocupado com a situação complicada o prefeito procurou alternativas. Com este espírito no final do ano passado alguns arcanjos [enfatiza] foram convidados a trabalhar na secretaria de Cultura e Turismo e aceitaram, vêm fazendo inclusive um ótimo trabalho como já se pôde perceber neste curto espaço de tempo e quase sem verba alguma produziram a Virada Cultural na cidade” e tal, tal, tal...Coloca como se essas ações todas fossem fruto do Deus tá vendo. Eu nunca vi o Deus tá vendo discutir estes assuntos, nunca vi o Deus tá vendo levantar um debate sobre a importância da cultura popular, nunca fui arcanjo do Deus tá vendo e a única pessoa que entrou na prefeitura do Deus tá vendo foi o Wilson Fort, pois o Titi já era da secretaria. Então, eu não entendo esse artigo querendo me vincular, e querer vender como se a gestão minha na secretaria de cultura fosse uma gestão Deus tá vendo. Isso aqui vai de encontro a uma matéria que está do lado, que Deus tá vendo é verdade. Se eles acham que Deus tá vendo é verdade, Olorum acha que Deus tá vendo tá mentindo.
E ainda ficar se vangloriando com ações dos outros?! Insinuar que o Libório era arcanjo do Deus tá vendo, que as minhas idéias eram idéias do Deus tá vendo, isso é uma grande mentira, uma grande falácia! Com que interesse isso foi colocado? E ainda tem mais mentira neste texto que eu li aqui. Falar que foram eles que acabaram com a OSCIP mostra um desconhecimento profundo do processo, já que foi uma ação popular impetrada contra a OSCIP. O Fábio Vieira já tinha feito um acordo de conduta técnica na justiça para acabar com isso porque ele sabia que era ilegal. Agora, falar que isso é mérito do Deus tá vendo também é mais uma falsa glória, no meu ponto de vista.

Outra coisa que quero deixar claro é que, ao contrário do que foi noticiado por aí, que a minha amizade com o Wilson Fort foi rompida, eu nunca fui amigo dele. O conheci quando ele foi na minha casa me convidar para ser secretário de cultura. Não tinha nenhum envolvimento com ele, nunca escrevi para o Deus tá vendo. Tinha críticas profundas ao Deus tá vendo de anos, que foram colocadas de lado para não ser um radical e não julgar a pessoa pelo que os outros falam.

Tem um artigo muito bom nesta mesma edição do Deus tá vendo que é Informação, desinformação e misinformação. E na outra página escrito “Deus ta Vendo é verdade”. O próprio jornal é super contraditório. Por que o que eles estão fazendo é desinformação e misinformação, criando factóide e vendendo isso como verdade. A questão da minha gestão até a minha saída da secretaria de cultura, da questão da OSCIP, da relação deles com o Fábio Vieira, isso tudo é desinformação.

Outro artigo aqui que é Desordem Urbana, que é a capa do jornal, pretende discutir a falta de postura, barracas no meio da rua, brigas. Isso é um exemplo do descompromisso que eles têm com o coletivo. Quando você discute código de postura, você tem que trabalhar primeiro a questão da relação interpessoal. Da postura que você tem com o coletivo, essa coisa de você se sentir superior e não se inserir nos movimentos coletivos da sua cidade... Eu nunca vi esse pessoal do Deus tá vendo em nenhuma reunião do plano diretor, do conselho da cidade. Tem um calendário aprovado de dois meses de reuniões nos distritos e na cidade para discutir os códigos de postura, e tem essa matéria falando sobre postura e não se fala do movimento que está acontecendo na cidade para discutir justamente isso? Acho que isso acontece porque não existe uma postura do senso coletivo. Eu prefiro a prática à teoria. Você só ficar de discurso, se achando superior, o dono da verdade, com arrogância e prepotência, isso não constrói transformação nenhuma. Não é esse tipo de postura política que o século 21 quer da gente. Temos que partir para o respeito à alteridade, divergir no debate e tentar buscar o que une e não o que diverge. Eu não acredito em pessoas que só ficam no blá, blá, blá. Isso não é coerente.

Dívidas - Para vocês terem uma idéia, esse relatório que eu pedi é porque o jornal que a Daniele Dantas distribuiu na Festa da Glória não foi pago. Ela mandou imprimir sem ter verba. Vários eventos realizados em Conservatória, os 150 anos da cidade, Festival de Cinema de Conservatória, nada tinha sido pago quando eu cheguei lá em 22 de outubro.

Então, eu perdi 40 dias da minha gestão conversando com fornecedores e prestadores de serviço que não receberam por serviços que tinham sido solicitados pela gestão anterior. Quando eu acordei já estava na hora de pensar em final de ano, reveillon, Folia de Reis e carnaval. Isso tudo eu me propus a fazer, que era trabalhar a questão da memória, da identidade, e nesses 100 dias que eu fiquei lá, o pouco que eu pude fazer, eu fiz. A exposição das Folias de Reis, o cortejo, de o encontro em dois dias, a virada multicultural, o mapeamento dos estudantes, o tema do carnaval, isso tudo estava dentro da minha filosofia de ação, mas o trabalho de gestão acabou que não tive tempo de fazer, porque fui atropelado pelo calendário de eventos da cidade.
Mesmo assim tentei plantar uma semente dentro desses eventos para que tivessem seqüência. A equipe que eu montei que ainda está lá - o Renato, o Gabriel, o Luis Francisco - eles têm plena condições de fazer isso. E gostaria muito que eles dessem continuidade a esses projetos.
Experiência - Quando você entra no poder público, e isso é uma coisa que eu me empenhei muito, atendi todas as pessoas que chegaram na secretaria de Cultura, seja da gráfica Rio Florense querendo cobrar, gente querendo criticar ou pessoas querendo apresentar projeto. Atendi a todos. Você tem que ouvir, que você minimiza os riscos de posturas antipáticas, arrogantes, prepotentes.

A minha experiência lá foi muito boa, aprendi muito, agradeço ao Wilson Fort ter me convidado a assumir o cargo, mas eu me desencantei com essa forma de postura, meio rolo compressor, de achar que é o dono da verdade, de achar que sabe tudo e não focar a ação dele na secretaria de cultura. É um cara que é inteligente e tudo mais, mas de boa intenção o inferno está cheio. Quando se ocupa um cargo público você tem que procurar ser o mais isento, imparcial possível e ter atuação com interesse público, não com interesse de alimentar seu ego, seu orgulho, sua vaidade ou achando que o único governo que vai ter chance de trabalhar é o do Fábio Vieira, em pensar em sugar ao máximo. Quem tem competência se estabelece em qualquer governo.

A gestão – Minha gestão se resumiu à manutenção do calendário tradicional da cidade. Com o diferencial das Folias de Reis. Mas qualquer secretário de cultura e de turismo tem essa agenda que é fixa. E neste ano o carnaval foi no inicio de fevereiro, o que gerou um desgaste profundo. Trabalhar a virada cultural diferente do que já foi feito, porque não foi apenas um showzinho de virada. E isso gera produção. Depois das Folias de Reis foram 12 dias de jornada, evento quase todo dia. Eu trabalhava uma média de 10 a 12 horas por dia. Acabou isso, foi direto carnaval. Eu sou totalmente contra essa política de eventos, mas eu tive que trabalhar com manutenção do calendário, que é obrigatório. A partir do carnaval que eu ia começar a pensar na seqüência do mapeamento, das oficinas artísticas e tal. Mas a verba da prefeitura, R$ 381 mil da função cultura, foi toda embora praticamente no carnaval.

Saída para falta de verbas - Das promessas que me foram feitas, uma era que a partir de 1º de janeiro, teríamos uma reforma administrativa implantada na prefeitura e eu teria autonomia para nomear quem eu quisesse. Isso também não se mostrou verdade. Até porque a estrutura administrativa que entrou em vigor a partir de 1º de janeiro é tão distante da realidade quanto a antiga. A secretaria de cultura e turismo precisa ter produtor cultural, captador de recursos, elaborador de projetos, avaliador de projetos. Já que a cidade é pobre, não tem recursos, PIB baixo, você tem que ter técnicos competentes para sair captando recursos, tem que ter planejamento.

Eu trouxe um profissional competente, recém-formado em produção cultural, para trabalhar comigo na questão de projetos de captação, mas acabou virando assessor do senhor sub-secretário. Ia gravar programa do prefeito. Até isso não foi respeitado. Então, em alguns momentos eu fui desrespeitado enquanto secretário. Tomava decisões e o sub-secretário resolvia outras coisas sem me consultar. Chegou a um ponto insustentável. E já que foi ele que me convidou, eu tive a hombridade de chegar na sexta-feira de carnaval e entregar o celular– que não servia nem para receber nem para falar -, simbolicamente, e junto a responsabilidade de assumir a secretaria, já que alguns compromissos que assumiu comigo ele não estava cumprindo.

Conservatória - Conservatória é uma república anárquica, independente dentro de Valença. Tem o primeiro arranjo produtivo local de cultura e entretenimento no Brasil, tem um mapeamento cultural feito pelo Sebrae e Instituto Idéias. Começou com a organização da sociedade civil, os empresários, produtores culturais, hoteleiros. Lá tem eventos culturais em 38 semanas no ano, e o ano tem 52 semanas. Ou seja, tem uma vida cultural muito mais adiantada que a própria sede do município.

Eu acho que a situação da emancipação de Conservatória está por um fio. Eu considero legítimo este caminho que Conservatória, Santa Izabel e Ipiabas estão tomando. Mas, como valenciano lamento, porque seria uma perda muito grande para o mosaico cultural e histórico do município, como as serestas e o quilombo São José.

Secretário de novo - Voltaria a ser secretario numa negociação muito mais límpida e transparente e com pessoas que tenham simplicidade, humildade e interesse coletivo na frente de arrogância, prepotência e interesse pessoal.

4 comentários:

Anônimo disse...

Sobre o Libório eu não posso falar muita coisa, apenas elogiar sua entrevista, porém, por outro lado, critíca-lo também, especificamente por sua inocência em acreditar em certas pessoas que se dizem preocupadas com o bem comum. Com relação ao Sr. Wilson Fort, é ele metidinho a ser intelectual, se acha o dono da verdade e, para piorar, é chato pra c.....! Paciência, não tenho que atura-lo mesmo.

Por fim, parabenizo os integrantes deste movimento por trazer a baila algumas discussões necessárias, apesar de muitas vezes de não concordar com uma certa parcialidade de seus comentários, em específico, as críticas quando são feitas, desprovidas várias vezes de "razão", sendo elas somente uma visão subjetiva de seus membros, os quais tem apenas visão parcial dos assuntos abordados.


Mas mesmo assim, PARABÉNS!

Anônimo disse...

Esse povo morre de inveja do Wilson Fort. O cara é bem na dele. E ninguém é capaz de negar sua inteligência. Eu o acho um cara muito legal e autêntico.
Nesta entrevista fica claro o ciúme do Libório pela figura de mais brilho do Wilson Fort.
Temos que reconhecer que é bom. E não ficar com ciúmes e inveja.
Gosto do Libório, mas sou muito mais o Wilson Fort.

Anônimo disse...

Ao anônimo aí de cima, se o rapaz é tão inteligente, pq não ajudou a administração só um pouquinho na administração do Fábio Vieira????? Pode até ser inteligente, não o conheço, porém, se mostro um GRANDE INCOMPETENTE!!! ISSO É FATO INQUESTIONÁVEL! e acho que o anônimo aí de cima ou é puxa saco ou é o próprio incompetente.


Abraço a todos

Anônimo disse...

Eita ferro! O governo Fabio Vieira teva, na SECTUR, o seu poço mais profundo das vaidades. O Libório disse certo: o WF foi o ghost do FV. Caras e bocas era com ele mesmo. E até conseguiu, por instantes, equilibrar o prefeito. Mas olha, aquilo era tarefa pra leão. WF andava numa direção, os "assessores" do FV iam em outra. Deu no que deu. Quanto à OSCIP, WF não teve ingerência nenhuma. Quando ele chegou na história o Ministério Publico, a partir de denúncias anônimas depois corroboradas pelo Conselho Municipal de Saúde e outros segmentos, já estava em cima. A sujeira foi tanta que a condenação saiu rápido: devolução de mais de 500mil aos cofres municipais. Bens indisponibilizados e tudo o mais. Foi, seguramente, um caos. O último parágrafo da entrevista do Libório é lapidar. É ingenuidade acreditar que isso é possível em um governo municipal nos tempos atuais. O grande erro cometido por ele foi ter denegrido a imagem da ex-secretária em público. Penso que foi ingenuidade dele. Quem o conhece sabe que atitudes assim não fazem parte de sua personalidade. Aqui sim, o dedo do WVF se fez presente. Quanto à falta de estrutura e profissionalismo ele está corretissimo. Pior que continua.