quinta-feira, 29 de julho de 2010

SOBRE A MEMÓRIA DE GENTE QUE FEZ VALENÇA VALER A PENA*


* Paulo Roberto Figueira Leal, jornalista e professor da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) - Artigo publicado no Jornal local de 29/7/10

Já há alguns meses, os amigos Gustavo e Paulo Henrique (do Jornal Local) e Vítor e Samir (do Valença em Questão) me solicitaram artigos sobre a realidade política de nossa cidade. A eles expliquei que, por conta de cargos administrativos que assumi na Universidade Federal de Juiz de Fora, onde leciono, estava vindo menos a Valença (o que implicava não estar acompanhando tão de perto a política local). Nesse sentido, pedi não somente um adiamento nas datas de entrega do material como sugeri também escrever mais sobre a política nacional do que sobre a municipal.

Esse continua sendo meu intento para as próximas ocasiões, mas me permito fugir à minha própria proposição para tratar agora de perdas recentes (e dolorosas), sobre as quais só neste momento estou conseguindo escrever: a de pessoas que eram, em graus diferentes, parcelas de minha história de vida nessa cidade. De uma pessoa central na minha trajetória pessoal, certamente uma das mais queridas com quem já convivi (minha tia Marise Resende Figueira) e de um ex-professor e amigo cuja inquietação intelectual sempre me serviu de estímulo (Steve French). Uma valenciana meio mineira, um inglês meio valenciano. Ambos nos deixaram nos últimos meses.

Da importância de Marise – ou melhor, da Tuca –  para mim e minha família é difícil falar: daquela que ajudou a nos criar, que estudava matemática comigo quando estava no primário, da tia querida presente em todos os momentos. Para não falar de sua importância para outros tantos amigos e mesmo para a cidade, como ex-professora do Instituto de Educação e da Faculdade de Economia, onde formou gerações de valencianos.

Ou de Steve, a quem conheci como professor de inglês, com sua proverbial cultura e seu ácido humor britânico, e com quem tive a honra de aprender tanto em sala de aula quanto fora dela (nas muitas conversas sobre política do cientista social refinado que ele foi). Do amigo a quem, infelizmente, vi muito menos do que gostaria nos últimos anos. Do professor de curso de línguas e da Faculdade de Letras que, tal como Marise, deixou os filhos dessa cidade um pouco mais inteligentes do que eram antes de conhecê-los.

Mais do que rememorar a tia querida e o amigo ex-professor, este artigo serve para lembrar que cidades não são lugares construídos de ruas e prédios: são, antes, lugares de gente, de afeto e de memória. Nas calçadas pelas quais andaram e nas casas que habitaram em Valença, Marise e Steve deixaram a cidade melhor, porque deixaram melhores as pessoas que partilharam suas vidas com eles. Se isso é verdade – e creio ser  –, Valença tem futuro: apesar das muitas incompreensões (e ambos, por vezes, foram vítimas delas), uma cidade que produziu ou que conviveu com gente como esta tem o dever de não se conformar com os muitos problemas que enfrentou e que enfrenta. 

Nestes momentos novamente turbulentos, em que muitos têm dificuldade em acreditar que Valença pode ter sucesso na superação de seus problemas econômicos e políticos de décadas, agarro-me à proposição de Antonio Gramsci: com o “pessimismo da razão”, mas com o “otimismo da vontade”. E o fato de que minha vida em Valença implicou a convivência com gente como Marise e Steve (e com muitas outras pessoas queridas e admiráveis que ainda estão entre nós) serve de alento e de combustível para este “otimismo da vontade”.  A Valença de Marise e Steve vale a pena, e não apenas como lembrança, mas como inspiração para o futuro.

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