sábado, 15 de setembro de 2012

VQ // 44 // Política

O mais do mesmo do palavrório político

“Mudança”, “novo”, “renovação” e “novidade” estão na boca dos candidatos às eleições. Mas em essência a maioria defende as mesmas propostas. A mudança só virá para os cidadãos valencianos se construirmos uma proposta diferente

Por Gilson Luiz Gabriel

Interessante: começa a corrida eleitoral e lá se vão os candidatos a compor seus discursos. Elaboram palavras de ordem, criam frases de efeito, produzem slogans na tentativa óbvia de pautar os desejos dos cidadãos.

Ao elaborarem seus discursos, a maioria dos candidatos lança mãos de muitos recursos. Alguns de fato conseguem convencer o eleitorado (ou enganar temporariamente o povo incauto). Outros, nas primeiras falas já se revelam e não atingem o objetivo de serem escolhidos, naufragando juntamente com seus marqueteiros, carregando a nau de verbetes com a qual tentaram transpor os mares da campanha.

Muitos termos usados pelos políticos concorrentes (pela maioria, pelo menos!), se analisados com um pouco mais de calma, dizem quem são e o que querem. E se assim o fizermos, corremos bem pouco risco de sermos enganados novamente pelos mesmos grupos. Ou seja, há um “palavrório” comum que aparece nos mais diversos palanques e que, de alguma maneira, coloca no mesmo saco de gatos alhos e bugalhos.

Senão vejamos. Um dos termos mais comuns nos tais discursos é a palavra “novo”. Recorrendo ao “pai-dos-burros” podemos achar os seguintes sinônimos para a palavra: que tem pouco tempo de existência; recente; que acaba de ser feito ou adquirido; que tem pouco uso; original. A partir de todos estes significados, olhemos os candidatos pelo que se apresentam: “o novo”. A maioria deles, de alguma forma, estão ou estiveram ligados aos grupos políticos que ocupam o lugar de mando na cidade (isto, por si só, já lhes torna velhos!). E ainda que não estejam próximos do “politiquismo” local, sustentam-se em partidos com alguma trajetória nas disputas e apropriações de mandatos em diversos níveis (mais uma vez revelam uma idade grande!). Dá pra perceber então que, se não são figuras conhecidas do grande público, já defendem as mesmas práticas por aqui implantadas. Defendem, portanto, continuísmos os mais diversos, sejam familiares ou grupais. No fim das contas pregam, cinicamente, a novidade carregada de teias de aranha.

Outro termo que vira e mexe ouvimos nessas campanhas eleitorais é “renovação”. Renovar é, a partir da utilização do prefixo “re” somado à palavra “novo”, “tornar novo novamente”, já que toda utilização do prefixo “re” traz a ideia de “fazer de novo” (reciclar, renascer, recolocar, reposicionar etc.). Se novo é aquele que é original (olha o Aurélio aí!), como tornar original algo que já é por demais conhecido? Da mesma forma, como “renovar” aquilo que já está nitidamente corroído pelo tempo e pelo uso? Que novo é esse? Respondam se puderem!

Mudança! Eta palavrinha recorrente nas bocas dos políticos! Alguns a transformam em “virada” ou coisa que o valha. Assim como o “novo”, a “novidade”, a “nova maneira de fazer política” sai das bocas dos que implantaram o atual estado de coisas como fórmulas mágicas. “Tá na hora da virada...” diriam alguns. Virada pra onde? Com quem? Com que projetos?  Como diria uma professora amiga do curso de Ciências Sociais, “mudar para manter o que aí está!”. Sim, pois os parâmetros que usam são os mesmos dos quais já nos calejamos. Os caminhos que trilharão para a construção de tal “mudança” são os mesmos já enferrujados trilhos de outrora. E que só serviram para nos levar ao descrédito com os políticos tradicionais. No fundo querem manter exatamente o que superficialmente criticam.

Também aparecem nas campanhas que testemunhamos termos como refazer, reconstruir, juntos com o tal do renovar. Ora, os políticos que hoje se apresentam como capazes de reconstruir, refazer etc., estiveram ou estão juntos ao poder político local há tempos. Isto quer dizer que, se a cidade está destruída, envelhecida, desfeita, é possível afirmar que, de uma maneira ou de outra, esses caras contribuíram para tanto. Por ação ou por omissão! Sempre defendendo algum interesse que, para ser alcançado, precisava do caos implantado e, aí, surgirem como salvadores da pátria (das próprias pátrias, diga-se de passagem!). O que pode ser observado, por exemplo, quando candidatos ou figuras próximas a eles com algum poder político na esfera estadual ou nacional aparecem falando em reabrir hospital, retomar obras paradas na cidade etc.

Tal palavrório, como visto, aparece de tempos em tempos. Em certos períodos fica retido nas entranhas dos candidatos para reaparecerem quando houver conveniência. Talvez hiberne ou fermente num processo de ruminação para ser vomitado de quando em quando sobre nós. O problema é que a fermentação e a hibernação transferem ao palavrório um azedume característico que só não ganha a repulsa daqueles que querem proximidade com ele. É perceptível a embromação. Mas, infelizmente, para muitos é mais fácil a opção pelo arrotado do que pelo alimento realmente novo, que não foi mastigado, tampouco regurgitado, tendo ainda as reais características do que é novo.
A novidade cantada pela maioria dos candidatos que disputam tão avidamente nossos votos interessa a quem? Tal “novidade” trará que novidades?  Que rupturas farão, ganhando as eleições, os que assim discursam? A resposta está na boca e aos olhos de todos nós: mudarão apenas as moscas! Em essência eles são iguais. Derivam de uma mesma escola. Defendem as mesmas propostas.
Entendo que mudança de fato só virá para os cidadãos valencianos se aceitarmos o diferente. E, se aceitando o diferente, nos dispusermos a construir sua proposta. E construindo sua proposta, tivermos a coragem para colocá-la em prática – seja através de um mandato para o Executivo ou para o Legislativo. Não aceitando esta tarefa, acredito, a história nos cobrará pelas bocas dos nossos filhos e netos, a oportunidade perdida.

Gilson é professor de Sociologia


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