segunda-feira, 13 de julho de 2009

'Todas as carceragens de delegacias estão em péssimas condições'

O VQ entrevistou o Deputado Estadual Marcelo Freixo (PSOL) para saber mais sobre debate que trata da construção de Delegacias Legais e casas de custódia. Não perdemos a chance, é claro, de ainda falar sobre a CPI do TCE, já que ele é vice-presidente da Comissão. Abaixo a entrevista:
Carceragens
O sistema carcerário é um dos maiores problemas que o Brasil tem hoje. É um problema de pouca visibilidade, porque o preso não vota, o assunto não tem apelo popular, a sociedade é muito conservadora no olhar sobre os direitos humanos; então, pra sociedade, quanto pior for a condição dessas pessoas, talvez melhor para o olhar punitivo que ela ainda guarda. Isso tem um processo pedagógico de luta da esquerda, que não é dos mais fáceis.

No Rio de Janeiro, existem oito casas de custódia construídas até hoje. Há mais nove aprovadas com dinheiro de empréstimo do BNDES. Três já estão quase prontas, com seis meses pra finalizar: uma em Magé e duas em Bangu. E pelo menos uma das outras seis será na região sul fluminense. Já tem verba pra isso, inclusive em processo de licitação. Essa definição deve sair em um ano.

Audiência Pública
Nós fizemos uma audiência pública, há um mês, pela Comissão de Direitos Humanos que presido, sobre a superlotação das carceragens da Polícia Civil. Foi uma boa audiência, onde conseguimos trazer Defensoria Pública, Ministério Público, Secretaria de Administração Penitenciária, Polícia Civil. Para meu espanto, foi a primeira vez que a Secretaria de Administração Penitenciária e a Polícia Civil sentaram pra discutir o sistema prisional. O que é um verdadeiro absurdo, porque são dois setores fundamentais do governo. Aí um deputado de oposição faz uma audiência pública e é a primeira vez que os caras conseguem sentar pra dialogar. Isso mostra um governo que não tem um mínimo planejamento, que não tem a mínima seriedade na condução de um assunto como esse.

Fizemos uma audiência pública pra tentar ter um plano de desativação das carceragens da Polícia Civil por uma razão: é completamente ilegal. Primeiro que a Polícia Civil não tem a função de custodiar preso. A função da Polícia Civil constitucionalmente é outra. Então, ter preso em delegacias da Polícia Civil é ilegal. E, além do mais, a Lei de Execução Penal diz que a previsão do cumprimento de pena é ou em presídio/penitenciária ou em casa de custódia/cadeia pública. Em nenhum momento a lei prevê a possibilidade de você estar preso na delegacia.

Casas de Custódia
A construção da casa de custódia é importante à beça. A casa de custódia oferece ao preso uma estrutura incomparável no que diz respeito às carceragens das delegacias da Polícia Civil. Em todas as carceragens a condição é muito ruim. Em Valença, certamente, não é das piores. Visitamos várias delas e fizemos um filme. Um exemplo é a carceragem das Neves, em São Gonçalo, onde são 800 presos, num lugar onde dizem que 400 dá pra suportar, mas bem cheio. São pilhas humanas.

Essa história começa a ficar numa situação mais grave num momento do governo Garotinho em que ele começa a lançar o projeto das Delegacias Legais. É um bom projeto, com a idéia de informatizar as delegacias, criar um sistema de informação entre as delegacias. Mas o problema é que tinha que ter existido um planejamento: para cada delegacia que você fosse construir, deveria existir uma rede de construção de casas de custódia. Se uma das medidas da Delegacia Legal é a desativação das carceragens, deveria então haver um lugar destinado para esses presos.

As Delegacias Legais eram mais fáceis de ser construídas do que as casas de custódia, por uma razão: todo o município quer uma Delegacia Legal e nenhum quer uma casa de custódia. Esse processo todo fez com que o governo investisse tudo em Delegacias Legais e não em casas de custódia. Aí, as delegacias que não se tornaram Delegacias Legais, ou seja, que continuavam ilegais, eram delegacias que iam superlotando. Nós chegamos a ter na Praça Mauá, na carceragem da Polinter, 1650 homens onde cabiam 250 pessoas. Conseguimos fechar essa carceragem com uma medida na OEA (Organização dos Estados Americanos).

A gravidade da situação
Hoje, o Estado do Rio de Janeiro tem aproximadamente 4.000 presos nas carceragens da Polícia Civil. Em péssimas condições e numa concentração muito grande. Dos 4.000, 800 estão em Neves e três delegacias da baixada estão na faixa de 600 presos.

Desde 2006 não se constrói uma casa de custódia no Rio de Janeiro. Hoje, o Estado tem uma média de 300 a 400 presos por semana. É quase a população de uma casa de custódia por semana. Então o governo teria que investir em quatro casas de custódia por mês. Isso é inviável. Tem que se repensar uma série de coisas: as penas, o judiciário, as penas alternativas têm que ser aplicadas etc. Muitos presos já cumpriram suas penas e não saíram.

Acho que precisa ter uma casa de custódia no sul fluminense pra que os presos fiquem ali. Isso é muito importante por causa das Comarcas, pra poder ter mais facilidade de ir ao Fórum, pra facilitar a visita da família. Isso é extremamente importante. É muito ruim você trazer um preso de Valença pra cumprir pena em Bangu, já que ele vai perder a visita por causa do custo de deslocamento e também pelo custo que o Estado terá para levar o preso para o juiz, mobilizar viatura, gente etc.

O debate ideológico
Esse é um debate que estou fazendo aqui de ordem prática, de arrumação da casa. Agora, tem o debate ideológico que é sobre o que a gente quer, se é uma sociedade que tenha sua juventude pobre e preta na cadeia. O perfil do sistema prisional hoje é claramente um perfil de classe. As cadeias hoje são um instrumento de detenção de pobre, de controle de classe, de construção de ordem muito eficazes e muito fortes. Esse é um debate de fôlego que a gente tem que fazer: discutir a concepção do judiciário, a estrutura econômica da sociedade. Imaginar que 80% da população carcerária brasileira não sabe ler, é analfabeta funcional, mostra que os presídios apenas consolidam a exclusão feita fora deles.

Prisão é ruim em qualquer lugar! Ela é a contrapartida da lógica do capital, porque o mundo global te deixa cada vez mais com uma outra noção de espaço e tempo. Para o preso é o inverso. E a população carcerária nunca cresceu tanto como na era neoliberal. A era neoliberal traz uma necessidade muito grande de que uma parcela da sociedade que sobra na sociedade de mercado seja detida. É a lógica da exclusão: quem serve e quem não serve na sociedade.

Basta ver os números: em 1995 a população carcerária brasileira era de 148 mil presos. Em 2006 era de 401 mil presos. Então, a década de 90 é o período em que a população carcerária brasileira se torna a quarta população carcerária do mundo.

A luta prática é ideológica, quando você reafirma que os presos não podem ficar naquelas condições. Isso é ideológico. O problema é que isso precisa ser resolvido agora. Enquanto a gente conversa aqui, os caras estão vivendo num lugar com tuberculose, não conseguindo colocar os dois pés no chão. Desativar as carceragens é um posicionamento ideológico, mas absolutamente imediato.

CPI do TCE
São três indiciados pela Polícia Federal, e o Graciosa é um deles, junto ao Nader e Jonas Lopes. Nossa CPI investiga aqueles indiciados pela Polícia Federal.

Eu não ia entrar nessa CPI porque eu tinha acabado a CPI das milícias, ainda estava me recuperando fisicamente e psicologicamente. Foi carga pesada. seis meses sem sábado, domingo, sem respirar. Mas a Cidinha Campos foi minha vice-presidente da CPI das milícias e veio dizer que eu seria o vice dela na CPI do TCE. Na CPI das milícias estávamos eu, Cidinha, André Corrêa, João Pedro e Paulo Melo. Na CPI do TCE estão Cidinha, eu, João Pedro e André Corrêa. O André Corrêa entrou nessa CPI do TCE por interesses locais também.

A denúncia da Polícia Federal sobre o Graciosa é impressionante. O que ele fez com o Tribunal de Contas, a quantidade de gente irregular, sem contrato, é assustador. O esquema envolve a empresa SIM. Hoje [18 de junho] descobrimos até o homicídio de uma fiscal. Ainda vai feder muita coisa! É um nível de podridão impressionante.

O esquema

O Tribunal de Contas é um órgão auxiliar da Alerj. Então os caras não podem ser investigados pela Alerj? Como não? Tem uma liminar que aguarda julgamento do Gilmar Mendes e já entramos com recurso. Enquanto isso, vamos dando sobrevida à CPI. É muito dinheiro e muito poder.

Se o Picciani não quisesse essa CPI, ela não teria acontecido, afinal ele tem o controle total da máquina. O Picciani quer essa CPI. Ele tem algum problema recente com o Graciosa. Qual é? Não vou saber nunca. Mas pra gente isso não importa. O que importa é se a denúncia procede. O que não podia era ter inventado uma denúncia, mas o esquema de maracutaia e propina é impressionante.

O grande esquema é com a empresa SIM. O TCE dispensa licitação dela, ela entra nas prefeituras, prefeituras sempre com royalties, e forma esse triângulo SIM-prefeitos-TCE. O que tem de dinheiro nessa história é impressionante.

4 comentários:

Anônimo disse...

Prezados,
O problema entre Picciani e Graciosa é do conhecimento de todos que circulam nos corredores da Alerj.
O atual presidente da Assembléia, e Eduardo Cunha (Deputado Federal/Xerife do PMDB Estadual) indicaram os três últimos presidentes da PRECI (Fundo de Previdência dos Funcionários da CEDAE). Sendo que os três estão multados pelo TCE e terão de devolver mais de 4 milhões aos cofres públicos.
Indignados, seus padrinhos políticos Picciani e Cunha, recorreram à Justiça alegando que o Tribunal não tem competência para julgar o fato.
Em primeira instância, o TCE ganhou e tudo indica que haverá ganho de causa nas instâncias que se seguem.
É o PMDB ESTADUAL seguindo os passos do partido em âmbito Federal, onde a vaidade e o interesse por cargos e facilitação da corrupção são o carro chefe da desenfreada disputa de poder.
É o Estado do Rio de Janeiro atualmente.
E que venham as próximas eleições, até por que haverá nova briga de poder: Picciani almeja agora, comandar o Senado Federal.
Graciosa ganhou nas urnas e na Justiça. Seria impossível, "comprar" o Supremo (maior instância do Judiciário no país).
Talvez aí, nova disputa, já que o Deputado André Corrêa representado por seu pai, candidato à prefeito que "fugiu" da disputa não conseguindo fazer se perpetuar os Corrêa na política valenciana.
Dinheiro e poder, realmente compram tudo. Entretanto, não compram a verdade nem a seriedade do STF.
Grato pelo espaço sempre democrático, aberto à todas as correntes de pensamento de seus leitores.

João Paulo P. de Souza.
Estudante.

Anônimo disse...

Caro xará Anônimo, uma coisa é o STJ anular as investigações, outra coisa é o conselheiro estar "limpo", coisa que ficou claro, com as investigações da PF e da CPi do TCE, que não está. O que ele conseguiu é anular as investigações que fatalmente o culpabilizaria. O que a sociedade deveria querer/propor é que ele fosse investigado e provasse que nada fez de errado. E também se mobilizar para o outro ser também investigado, pra responder por seus crimes.

o que o entrevistado deixou claro aqui é que, com problemas pessoais ou não, o que importa é que há crime. E o papel da Alerj era investigar. Se a PF consegue encontrar crimes do presidente da casa, a própria Alerj deveria instaurar uma CPI do presidente da casa.

é ou não é?

Anônimo disse...

confundi o João PP de Souza com anônimo. foi mal aí.

Anônimo disse...

Uma coisa é a assembléia não poder julgar.
Outra coisa é PROIBIR investigações de supostas irregularidades que vinham de várias direções.
Será esse mesmo o papel da justiça?
Ser cega para agir imparcialmente ou ser CEGA para não ver o que incomoda e não trazer à tona atos ilegais?