quinta-feira, 27 de setembro de 2007

Valença em transformação?

Após um período de três meses (para mim quase uma eternidade!), voltei para uma visita à Valença nos primeiros dias do mês de agosto. Retornei a minha cidade natal, da qual, há 12 anos me despedi como fazem alguns jovens em busca de alternativas de formação e trabalho. O leitor poderia se perguntar: qual a novidade nisto? Bem, a princípio, nenhuma, já que para a realidade desses jovens, essas idas e vindas são comuns. Por outro lado, nem sempre são tão comuns, ou explícitos, os motivos que envolvem esse “retorno”. Sem deixar dúvidas, a saudade da família e dos amigos justifica tal regresso e, sobretudo, mantêm as raízes fundadas, os sentimentos de pertença e afirmação das origens e lembranças que nos forjam.

Ao andar pelas ruas, passando pelas casas, praças, jardins e, principalmente, ao encontrar com as pessoas, sempre sob os “olhares” atentos dos morros e montanhas que rodeiam a cidade, em um primeiro momento o pensamento que me assalta é (re)conhecido: nada mudou nessa cidade. Será? Estranhamente, como se eu fosse um turista (de fato, assim me sentia), as luzes brilhavam em tons e cores distintas das que minha memória me permitia recordar. As casas, praças e jardins pareciam ter assumido formas e detalhes até então não percebidos. Os contornos, ladeiras, travessas, árvores e morros pareciam querer me dizer algo que até aquele momento não tinha parado para ouvir. Seguramente, a cidade havia mudado, mas não apenas ela, também eu havia de ter experimentado transformações.

Assim como a História, os homens e mulheres que a fazem não são imutáveis. Inegavelmente, Valença não é mais a mesma. Tampouco o são os homens e mulheres que constroem a história desta cidade. Jovens continuam indo e vindo, obviamente aqueles que podem ou ousam enfrentar as limitações que cerceiam suas possibilidades de formação e trabalho. Poucas foram as transformações capazes de satisfazer suas necessidades, bem como as do conjunto da população valenciana.

Entretanto, mesmo aqueles que permanecem, por opção ou por necessidade, criam e recriam essas mesmas necessidades (e liberdades). Por exemplo, a praça ou Jardim da Glória, antes apenas mais um dos belos jardins da cidade, agora comporta um vibrante encontro de bandas de rock’n roll. Em conversas, pude constatar que militantes ambientalistas e do Sindicato dos Profissionais de Educação mantém-se mobilizados nos processos educativos e de valorização das lutas sociais, indispensáveis ao reconhecimento dos direitos dos valencianos/as. Direitos esses tão secundarizados em tempos neoliberais de “farinha pouca, meu pirão primeiro”, onde a diferença entre o cidadão e o marginal (o que está à margem) se define meramente pelo acesso ao consumo.

Na cidade em que muitos se orgulham de ter sido a maior economia cafeeira do país, poucos se lembram de ter sido ela também a que absorveu os maiores contingentes de escravos africanos do Brasil, exatamente para produzir a riqueza que sustentou o baronato e as forças políticas conservadoras que parecem teimar em serem abolidas, assim como a exploração que, verdadeiramente, ainda não o foi. Nesta cidade, felizmente ainda pulsa a memória viva dos negros reunidos no Quilombo São José, bem como em outros espaços de resgate e celebração da cultura negra, de resistência e reprodução da vida.

Valença mudou, se para melhor ou pior, talvez tenhamos oportunidade de refletir em outro momento. Valença continuará mudando, enquanto persistirem mulheres e homens que coletivamente preparam os rumos da mudança. Não poderia ser diferente, caso contrário negaríamos o próprio movimento da história que permite aos sujeitos atuar permanentemente sob os marcos que definem o modo como se situam em suas relações, consigo e nos grupos sociais.

Texto enviado por Luiz Americo Araujo Vargas, valenciano, biólogo e mestre em Educação pela UFRJ e pesquisador do Laboratório de Políticas Públicas da UERJ.
americo@lpp-uerj.net

Um comentário:

Anônimo disse...

bonito texto.

mudanças e tranformações sempre estao acontecendo na nossa princesinha, como em todo lugar, pena q nem sempre sao pra melhor.