terça-feira, 2 de novembro de 2010

Deu n´O Globo (2/11): O Acocoramento Real *

* por CHICO ALENCAR  
 
O que me interessa é a Política com P
maiúsculo, a Política que é história." 
(Joaquim Nabuco, 1849/1910)

É consenso: o próximo Congresso Nacional garantirá maioria ao Executivo. Grande parte dos seus componentes, “suscetível” a argumentos sonantes mas nem sempre visíveis, dará sustentação incondicional ao governo. É esta subserviência sem fundamento programático — e não a acolhida a iniciativas populares, ministro Gilmar! — que coloca o Legislativo de cócoras. Péssima tradição nacional.


Mandatados por 71% dos 135.804.433 eleitores para representálos na Legislatura 2011/2015, os parlamentares aceitarão como natural essa continuada redução de sua função? O acocoramento do Poder Legislativo apequena a República e desrespeita a Constituição, que o define como o primeiro dos Poderes da União. O traço do arquiteto colocou o prédio do Congresso Nacional no centro da Praça dos Três Poderes, em Brasília, para destacar sua relevância. Relegado à condição de despachante dos Executivos, casa homologatória, espaço de fisiologismo e “carreiras” medíocres, o Parlamento entra em ocaso.

Quase todos os partidos vivem um célere processo de nanismo moral e político, afrouxando fronteiras éticas e ideológicas. É tão deplorável como comprovável: na disputa eleitoral, somas milionárias — cujos doadores ainda não foram revelados — bancaram alianças estapafúrdias, com o adversário figadal de ontem sendo o “mais novo amigo de infância” de hoje. A política institucional, no Brasil do século XXI, perdeu o pudor, o compromisso com a coerência. A corrupção é banalizada, inculca-se no senso comum a ideia de que sem concessões de todo tipo não se logra êxito. Aceitase que o único caminho para o poder é o calçado por malfeitorias.

Para que nossa democracia não seja luxuosa hipocrisia e representante do povo aquele que tem um bom emprego, renovável a cada quatro anos, cumpre fecundá-la de valores republicanos. E entender o Parlamento como espaço do dissenso, do embate sobre grandes projetos nacionais e mundiais: somos pessoas, classes e nações planetárias.

Saramago, com sua palavra cortante, alertava para o perigo de um voto que é só delegação: “Até que venha nova eleição, o eleito terá a seu favor o respaldo dos votos de seus eleitores para violar os fundamentos da democracia. Essa renúncia legaliza o saque ao poder por parte da minoria eleita.”

Contestando a composição majoritária de uma base servil, mantida pelo “toma lá dá cá” dos acertos de gabinete, é preciso que, a exemplo do belo processo que culminou com a ampliação das inelegibilidades do Ficha Limpa, cobre-se um Legislativo independente, fiscalizador, propositivo. E que sua pauta inclua as inadiáveis reformas política, agrária, urbana e tributária, a auditoria da dívida pública, a ampliação de recursos para educação e saúde, a garantia dos direitos dos trabalhadores, a centralidade do cuidado ambiental e políticas internacionais que não aceitem hegemonismos. Um Poder aberto à participação popular, que tenha efetividade na superação da maior e mais persistente chaga social do Brasil: a desigualdade.

“Utopias generosas nunca fazem mal” — afirmava Joaquim Nabuco, deputado em época de grandes transformações. “O que elas têm de impraticável fica esperando indefinidamente pela sua hora; mas o sentimento que as inspirou, e as impressões que elas criam, concorrem sempre para realizar algum bem.” Futuros deputados e senadores do Brasil, não se divorciem dos movimentos vivos da sociedade, exerçam seus mandatos com grandeza!
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Chico Alencar é deputado federal (PSOL/RJ), reeleito.

2 comentários:

Perguntar não ofende disse...

Falando nisso, e a campanha pra prefeito? Não se configura campanha eleitoral fora do prazo a quantidade de carros adesivados e até placas em locais visíveis ainda com a campanha de Fernandinho e Álvaro??

Tá certo que a justiça é cega, mas o juiz eleitoral não precisa ser, não é mesmo?

E outra coisa: maior caô esse negócio de nenhum dos dois querer ser mais candidato a prefeito, hein? Esse negocio que a familia não quer, é apenas dissimulação pra afastar possiveis gaviões do botim que é a prefitura de Valença.

Alias, é o que mais querem as "famiglias" dos candidatos, uma vez que a maioria delas se enriqueceu as custas da administração pública.

Parem de caô!!!

Anônimo disse...

Boa pergunta. E a eleição para prefeito? Outros TREs já marcaram suas eleições suplementares. Por que o nosso do RJ, não?
E quanto ao artigo postado, o sistema eleitora no Brasil já caducou faz tempo!!! Só o que se gasta...